quarta-feira, 23 de outubro de 2013

"Amada Vida", José Tolentino Mendonça


"Pode parecer estranho, mas a certa altura agarramo-nos à dor como se ela fosse um heroísmo e pomo-nos a expor feridas como quem exibe condecorações (...)

A nossa cabeça de pessoas crescidas é complicada (...)

Descobrimos que há um prazer em listar achaques e tradições, e se a minha chaga puder ser maior do que a tua tanto melhor, isso reforça o meu estatuto. 
A verdade é que, se não tomamos atenção, a desgraça intima torna-se um escazelado pódio onde nos blindamos (...)

Muitas vezes aproveitamos a dor para nos instalarmos nela.
Preferimos ficar a esgravatar na ferida, e comer diariamente o pão velho da própria maldade, em vez de termos sede de beleza, desejo de outra coisa."


José Tolentino Mendonça, in "Revista" de 19 Outubro 2013
do Jornal Expresso

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